sexta-feira, 23 de julho de 2010

considerações a mim mesmo

Sou uma pedra escondida no campo
Espero a lâmina fria e afiada do ceifador
Ela vem uniforme a decapitar as flores que teimam em brotar
Só querem espinhos e pastos
Eles querem alimentar a besta que comanda
Não permitem que a beleza aflore nesse campo
Querem o campo, mas não querem as flores
Porque as flores atraem outros seres
Pois os seres podem espalhar os polens
E as flores podem tomar o campo
Por isso o ceifador trabalha ininterruptamente

Ainda não posso correr de encontro à lâmina
Minha natureza não me permite, pois sou uma pedra
Eu já fui flor e não temi a lâmina
O espírito da produção me requisitou
E me convidou a ser pedra
As pedras segam a lâmina
Podem chegar a quebrá-la

Eu estou no campo de batalha
Outras pedras estão comigo
Espalhadas como minas terrestres
Digo às flores que resistam
Elas são a beleza do campo
Não se preocupem com a lâmina
Se preocupem com o campo
Às vezes flores querem ser pedras
Pois a lâmina não resistiria
Mas eu digo ás flores que sejam flores
Não podemos provocar o desequilíbrio
O campo precisa de todos

Quando a lâmina chegar eu vou esta pronto
Ou eu a sego e fico intacto
Ou a sego e me despedaço!

sábado, 22 de maio de 2010

Nostalgias da cruz

Na epistemologia dos meus versos
concateno os paradoxos dos quais me fazem o que sou
eu qu sonhei e amei
que assim como todos passei pela vida sem a ter em minhas mãos
ah, que delícia da conciência da finitude
enquanto assisto um pequeno erro do ego humano...

Nostalgias da Cruz
assisto o espetáculo do Deus crucificado
e me delicio com o saboroso gosto do castigo.
Castigo para educar
persuadir
evitar.
Nada mais demasiadamente humano
e ao mesmo tempo divinamente humano!

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

01-10-2010

Eu desmaterializo a realidade em forma de pensamento
Não invento, não modifico o real, aceito as coisas como elas são.
Talvez por ter consciência de que elas não dependem de min eu me dê por satisfeito
Quando se apagarem todos os vestígios da minha existência e o “eu” subjetivo não mais existir, as coisas continuarão a ser o que são. REAL.
O que há não tem nenhuma relação de dependência com o que sou
Porque o que sou é apenas como o que há se apresenta a min
E nessa dissonância do que há com o que sou é que me perco de imediato e não preencho essa lacuna.
Mas ao menos não transcendo, não tenho idéia de perfeição no sentido convencional da palavra.
A finitude sim, essa é perfeita.
O bom e o mau são perfeitos, exatamente por serem o que há.
E o bem e o mal são invenções, daqueles que negaram a beleza do sol e hipotetizaram um astro transcendental.
Eu não escolhi hipotetizar seres Supra-sensíveis.
Aceito as coisas como são
Não invento
Apenas desmaterializo o real em forma de pensamento!

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

O Sono dos Deuses (com empatia)

Dormes à beira da calçada
Enquanto os vermes comem tua carne e vão de encontro às víceras
Se tens forme dorme
Quem sabe sonhas com um banquete à altura da tua fome
Defunto a qual as chagas putrefam às esperanças
E do qual a dor se assemelha a de um soldado da I grande guerra
Queres morfina? Não temos morfina!
Deixai teu corpo produzir o anestésico
Liberando de acordo com a dor que sentis
Mas dorme
Num sono não tão profundo quanto o do Deus que te deram
A única coisa que te deram no mundo

Dorme com o sono dos incontestados
Com a fome dos não saciados
E com a dor dos não encontrados
A tua única esperança é não acordar
Porque vivis às avessas
Pois a realidade é o teu pesadelo
E o teu maior sonho é não enlouquecer, quando não é um prato de comida.

Nas alucinações vê bichos que querem te comer
Mas te acalmes ainda não estas louco!
É que a dor e a fome trabalham em comunhão
A sugar os últimos instantes da tua vida

Dormes à beira da causada
Sujeito sem nome
Mas isso não é o pior
Nada é tão desumano quanto não ter rosto
Nem te lembras a última vez que te olharam nos olhos
Faz tempo, nem quem te olhou se lembra!
É que sem família e lar ninguém tem identidade
E sem terno somos todos invisíveis

Dorme defunto social
Dorme de encontro à morte
A sociedade te cobra isso
Mas não ficas a fazer entulho nas causadas
Por que amanhã tem outro
Enquanto os deuses dormem!